Nuevo Pachacutec foi construída em uma região desértica, com acesso restrito à água
Lima, que sedia até esta sexta a 20ª reunião da ONU sobre o clima, é também uma amostra dos desafios provocados pelo baixo suprimento de água.
A capital peruana é tida como a segunda maior cidade do mundo construída sobre um deserto, ficando atrás apenas do Cairo, no Egito. As chuvas na capital peruana costumam somar apenas 50 mm de água por ano (equivalente à média histórica de chuvas em São Paulo apenas no mês de junho 2014).
13/12/2014
Perto dali, a uma hora de distância da capital, a comunidade de Nuevo Pachacutec ilustra tanto as dificuldades dos moradores em obter água quanto a descoberta de possíveis soluções que podem servir de referência para outras comunidades do mundo, inclusive no Brasil, onde cidades como São Paulo vivem a pior crise hídrica de sua história.
Em um dia recente em Nuevo Pachacutec, a rotina de dezenas de milhares de pessoas envolve esperar um caminhão-pipa para encher barris plásticos com água, a custos que muitas vezes pesam no bolso dos mais pobres.
Os primeiros dos 160 mil moradores da região chegaram ali nos anos 1980, em resposta a políticos que lhes prometeram terras em troca de votos.
Muitos ainda não têm um título legal que lhes garanta a propriedade da terra.
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Alguns quilômetros ao sul de Nuevo Pachacutec, um riacho sujo serpenteia sob uma rodovia, margeado por sacos de lixo. Trata-se do rio Chillon, a única fonte de água para cerca de 2 milhões de pessoas ao norte de Lima.
Mudanças climáticas
As águas do Chillon vêm de geleiras dos Andes. E isso é motivo de preocupação.
Rio que abastece parte da comunidade está sujo e sente os efeitos das mudanças climáticas "Estamos preocupados aqui no Peru porque as mudanças climáticas já estão tendo um grande impacto no nosso acesso à agua", diz Armando Mendoza, pesquisador da ONG Oxfam no país.
"Nos últimos 40 anos, a cobertura glacial recuou mais ou menos 40%, por causa do aumento das temperaturas globais. As previsões são de que, no futuro, o acesso à água ficará ainda mais difícil, e os pobres estão mais vulneráveis a isso."
Essas questões de longo prazo, porém, não são a prioridade imediata em Nuevo Pachacutec.
Apesar de 80% das casas da região serem feitas de madeira, as rendas e as aspirações estão crescendo por ali. As poeirentas ruas da comunidade estão repletas de placas indicando postos para lavar carros e escolas particulares.
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Só que o acesso à água é crucial para continuar esse desenvolvimento, assim como em outras comunidades ainda carentes do mundo.
Com financiamento do governo alemão, um grupo ecológico chamado Alternativa tem ajudado a construir redes de tanques de água, conectados por uma tubulação subterrânea que leva a água diretamente para as casas.
Muitas casas têm barris, que são abastecidos por caminhões-pipa, mas condições de higiene são ruins Também instalaram 900 pontos externos de distribuição de água ao longo da comunidade.
Até agora, esses esforços têm permitido o abastecimento de 9 mil casas.
Por ali, a água não é apenas uma substância vital para a vida - é um indicador de status social e progresso.
Saúde e sujeira
Daniza Cruz Navarro mora em uma parte do bairro onde ficam as "casas azuis" - diante de cada uma delas há um barril de plástico azul, alguns com tampas. Os barris são abastecidos pelos caminhões-pipa que passam pela região.
Mas esses barris são, também, usados por mosquitos para depositar seus ovos.
"Você vê os efeitos da forma como a água é armazenada na saúde das crianças", conta Daniza.
Ela desistiu dos barris e agora tem um tanque mais eficiente, que comprou com a ajuda da Alternativa.
No entanto, como Daniza ainda depende dos caminhões-pipa, acaba pagando mais pela água do que seus vizinhos.
Ela gasta o equivalente a R$ 90 por mês pelo preciso líquido, cerca de 10% de sua renda familiar.
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Os que estão conectados à tubulação subterrânea pagam apenas o equivalente a R$ 9 por mês.
As diferenças de gastos acabam causando tensões entre os vizinhos. Apesar disso, especialistas dizem que muitos progressos foram obtidos em Nuevo Pachacutec, sobretudo em termos de empoderamento das pessoas.
Yycella conseguiu abastecer sua casa com água, mas paga caro por isso "Mesmo que (a situação) não esteja perfeita, melhorou consideravelmente", afirma o engenheiro Osvaldo Caceres, da Alternativa.
"A infraestrutura é gerenciada por eles, para eles. A população local sabe o que quer, mas entende que tem de participar para consegui-lo."
"Quando chegamos aqui, era tudo deserto - não havia estradas, apenas areia", diz Ycella Bonilla, outra moradora de Nuevo Pachacutec.
Ela mostra, orgulhosa, cômodos recém-construídos em sua casa: um banheiro e uma lavanderia, que ela fez com a ajuda de microcrédito.
Ycella diz que são "unidades de dignidade".
Mas, apesar desse avanço, ela e sua família ainda pagam caro pela água. Ela tem uma mangueira e uma chave, que acopla a cada ponto de água. Paga cerca de R$ 60 por mês.
O esforço pelo desenvolvimento e a necessidade de contar com recursos como a água não se restringe a Nuevo Pachacutec.
Perto dali, em Lima, negociadores do clima tentam buscar alternativas para dilemas semelhantes que se repetem em diversos lugares do mundo.
Em reunião da Conferência da ONU sobre mudanças climáticas, que se encerra nesta sexta-feira no Peru, os negociadores debatem como conciliar as necessidades de uma população mundial crescente com as ameaças que isso causa ao planeta.
O engenheiro Osvaldo Caceres diz que, assim como os problemas da água começam a ser equacionados em Nuevo Pachacutec, a batalha climática global talvez possa ser vencida, se todos fizerem sua parte.
"Cada agente dessa cadeia tem de assumir responsabilidade pelo que tem de fazer", opina. "Governos, autoridades e obviamente o povo, todos têm de agir. Não há outro modo."
fonte;bbc brasil
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