O país, apesar de vigoroso e sólido, vive complexas e profundas contradições desde sua fundação, em 14 de maio de 1948.
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O aeroporto Ben-Gurion, principal porta de entrada para Israel, fica encravado no meio do caminho entre Jerusalém e Tel Aviv. Uma auto-estrada ampla, de quatro pistas, asfaltada com requinte, conduz os recém-chegados para qualquer um dos lados. A leste, para quem se destina ao centro religioso do planeta. A oeste, para uma cidade mediterrânea e cosmopolita.
Mikhail Frunze/Opera Mundi
Cena cotidiana à beira do mar em Tel Aviv. Economia de Israel cresceu, na última década, a um ritmo médio de 3,4%/ano.
22/06/2014
Quase dez anos após a onda de ataques executados por homens-bombas, o ambiente da principal cidade judaica do mundo pouco faz lembrar um dos mais longos e tensos conflitos do pós-guerra. Ou de que se está em um Estado confessional, no qual a religião desempenha função primordial de identidade e regulação da vida privada.
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Novos edifícios, vários de alto luxo, nascem como espigões no chão de Tel Aviv, a maioria destinada a estrangeiros, especialmente judeus ricos, que buscam um rincão da terra prometida, mas de frente para o mar. Bulevares arborizados recortam movimentadas avenidas e servem de passarela para observar o quase onipresente acervo arquitetônico de estilo Bauhaus. O branco toma conta da paisagem. Restaurantes elegantes e bem decorados parecem sempre cheios.
Moças de vestido curto e shorts, rapazes de calças jeans ou bermudas, aproveitando o tempo quente e seco da primavera, inundam as ruas centrais. Raramente se encontra um rabino ou sequer alguém usando quipá. Salpicam alguns recantos históricos, como os mercados a céu aberto ou a cidade árabe de Jaffo, incorporada como distrito depois de 1948. Mas Tel Aviv, com região metropolitana superior a três milhões de habitantes, exala um hálito de modernidade.
Mikhail Frunze/Opera Mundi
Jovem soldado israelense em Tel Aviv, cidade mais cosmopolita do país, caracterizada por seus arranha-céus e amplos bulevares
O município é a locomotiva de uma economia que cresceu, na última década, a um ritmo médio de 3,4% ao ano, apesar da crise internacional que abalou os Estados Unidos e a Europa a partir de 2008. Israel passou a receber crescentes investimentos diretos em suas plantas industriais.
As principais empresas dessa escalada produtiva são companhias de alta tecnologia, concentradas em informática, equipamentos militares e produtos farmacêuticos. As chamadas hi-tech respondem por quase 50% das exportações do país. Instaladas majoritariamente no cinturão periférico de Tel Aviv, viraram a meca das pessoas que se formam nas universidades e sonham em fazer seu pé-de-meia.
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Custo social
Esse dinamismo, contudo, teve pesado custo social. Além das despesas com as forças armadas representarem cerca de 30% do orçamento nacional, esse item também sobrecarrega as importações, provocando saldos negativos na balança comercial. Mesmo com os EUA arcando, a fundo perdido, com 20% dos gastos em segurança (aproximadamente 3,5 bilhões de dólares anuais), Israel só sai do vermelho atraindo novos capitais.
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Atualmente 23,9% dos israelenses vivem com menos de 27 dólares diários, apesar da taxa de desemprego estar em 6,3%
Enormes subsídios e isenções fiscais são concedidos, com esse propósito, para o mundo dos negócios. A contrapartida, para combater o déficit interno, é uma forte redução das verbas alocadas em programas sociais e serviços públicos, agravada pela desregulamentação de direitos trabalhistas. A economia cresce, mas a riqueza se concentra e a pobreza se expande.
O número de pessoas cuja renda é inferior a 40% do salário médio subiu, desde 2003, de 7,8 para 12,1%. Abaixo de 50%, de 15 para 19,8%. Se o corte for de 60%, de 23,3 para 26,8%. Os dados são da OCDE (Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento). Há 15 anos, 16% dos israelenses viviam abaixo da linha da pobreza, segundo relatório do Instituto Nacional de Seguros, órgão governamental. Atualmente 23,9% dos cidadãos vivem com menos de 27 dólares diários, apesar da taxa de desemprego estar em 6,3%.
A onda de protestos que varreu Tel Aviv e outras cidades, em 2011, foi uma resposta a essa situação. Mais de 500 mil pessoas participaram de protestos, cuja reivindicação principal era a redução dos aluguéis e do preço das moradias. A renda média dos israelenses dificilmente suporta o custo habitacional, em um mercado imobiliário que se voltou para o topo da pirâmide.
Cerca étnica
O muro social vai ficando cada vez mais alto, mas ainda não compete com a cerca étnica. Os árabes-israelenses representam cerca de 22% da população nacional, de 7,5 milhões. O salário médio entre esse grupo, de 1,5 mil dólares mensais, é 32% inferior ao de trabalhadores judeus. Mais de 53% das famílias palestinas vivem na pobreza, entre as quais o desemprego passa dos 10%. Das 40 cidades israelenses com maior quantidade de moradores sem trabalho, 36 são de maioria árabe.
Nos territórios ocupados da Cisjordânia e Jerusalém Oriental as cifras são ainda mais severas, ainda que as estatísticas sejam inexatas ou contraditórias. O problema se agrava, contudo, porque essas populações não possuem sequer direitos civis e eleitorais. Essas áreas foram isoladas por um sistema de muralhas e alambrados, sob a justificativa de deter a onda de atentados em solo israelense.
Wikicommons
Muro da Cisjordânia, ou "muro do apartheid" para os palestinos, construído pelo Estado de Israel por questões de segurança
Aparentemente esse objetivo foi alcançado, apesar do lançamento de mísseis provenientes da Faixa de Gaza continuar desafiando a segurança do país. Mas o custo econômico e social para os palestinos é estrondoso. Não podem mais buscar empregos nas fronteiras oficiais do Estado sionista. Sua mobilidade está fortemente limitada. As perdas de propriedades e plantios são expressivas.
Esse cenário estabeleceu uma parede entre Israel e a comunidade internacional. As Nações Unidas consideram ilegais tanto a ocupação destes territórios quanto o sistema de segregação espacial. Resoluções recentes também condenam o processo de colonização judaica dessas áreas, que deveriam pertencer ao Estado palestino. Assentamentos na Cisjordânia são oficialmente estimulados, recebem subsídios e têm sua guarda garantida pelo exército, além de serem encapsulados pelo muro da separação.
Alguns intelectuais e líderes sionistas mais à esquerda passaram a declarar, nos últimos anos, que Israel estava perigosamente caminhando para um modelo inspirado pelo apartheid sul-africano, por conta da estratégia que conduz em relação à questão palestina. As correntes mais à direita, atualmente no governo, rejeitam a comparação e afirmam que as medidas respondem apenas às necessidades de combate ao terror.
Os críticos desse ponto de vista afirmam que a solução para a paz não está no erguimento de muros, mas na negociação de um acordo permanente para a existência de um Estado palestino viável e autônomo. A maioria das lideranças relevantes, incluindo o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, discursa a favor dessa saída. Mas há muitas dúvidas se alguns dos protagonistas não estão apostando em fazer, do transitório, uma eternidade.
O fato é que Israel chega aos 65 anos de sua independência, celebrados nesse 14 de maio, como uma nação vigorosa e sólida, mas espetada por contradições. Exibe vitalidade econômica e poderio tecnológico. Vive, contudo, os conflitos de um sistema que produz desigualdade social, discriminação étnica e tentação colonial.
Fonte;operamundi.uol.com.br/conteudo/reportagens/28858/israel+vive+dilemas+de+sociedade+murada.shtml
opera mundi
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